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Ser Neurocirurgião

Atualizado: 29 de mai.

Não sei o que seria de mim se não tivesse me transformado em um neurocirurgião. Não consigo imaginar algo que me oferecesse uma fração do prazer, da alegria, da plenitude e estado de absoluta realização pessoal de quando estou em um centro cirúrgico, usando meu conhecimento, minha técnica e habilidade para tentar reparar o órgão mais importante e sensível do corpo humano.


Não sei se sou romântico demais, mas para mim, uma cirurgia é como uma obra de arte. Vejo beleza, vejo emoção, vejo inspiração. As cores, os detalhes, a maestria com que temos de aplicar nossa técnica.


Me entusiasmo com a possibilidade de realizar uma obra-prima. Pode ser exagero de minha parte, mas eu realmente me transporto para outra dimensão ao vestir um jaleco azul ou verde. Que me desculpem os mais pragmáticos, mas tenho paixão em ser neurocirurgião. Tenho prazer e orgulho.


Às vezes nos achamos deuses por ter frequentemente a vida de pessoas em nossas mãos. A ilusão de que somos aqueles que decidem sobre a vida ou a morte de um paciente. Mas só nós somos capazes de saber o que significa salvar a vida de uma pessoa. Mas, por outro lado, só nós sabemos o que significa sermos incapazes de salvar a vida de um paciente a despeito de todos os nossos esforços. Não há como não nos sentirmos os piores dos piores. Neste instante nos colocamos no ponto mais distante possível do conceito de divindade e onipotência.


É por isso que sempre repito que ser neurocirurgião é mais do que uma profissão: é uma missão. Esta montanha russa emocional definitivamente não é para amadores. A despeito de todo conhecimento, toda técnica, toda boa vontade, só pessoas de fibra, de força interior e despojamento são capazes de lidar com o que temos de lidar todos os dias.


Nossas famílias também sofrem, vocês sabem muito bem. As prolongadas ausências, a inexistência de sábados, domingos e feriados, chamados no meio da noite, as interrupções abruptas de eventos familiares. Vale lembrar que nós escolhemos a profissão de neurocirurgiões, não eles. E mesmo conscientes de que nosso sacrifício também é pelo bem deles, temos de valorizar, e muito, o papel da família em nossas vidas e entender eventuais protestos. Arrisco a dizer que, sem eles, não teríamos condições de exercer nossa atividade em sua plenitude.


Apesar de estarmos ali para tratar do cérebro, na verdade estamos cuidando é do coração das pessoas. A carga emocional que todo o processo enseja, os diagnósticos inconclusivos, a proximidade da morte, a tristeza e a alegria, o choro. Por isso defendo e sempre defendi o tratamento o mais humanizado possível. O respeito, a atenção, o carinho com aquele que está passando pelos piores dias de suas vidas. Não apenas por uma questão humanitária, mas porque acredito que um tratamento mais humano faz toda a diferença. É claro que não estou comparando com a medicação, mas o carinho, o amor e o respeito também são drogas poderosas. E não apresentam nenhum efeito colateral. Portanto, não é uma questão de personalidade do médico, mas uma obrigação

profissional.


Isto é ser Neurocirurgião.

 

 

Escrito por: Dr. Jose Marcus Rotta


  • Diretor do Serviço de Neurocirurgia IAMSPE - São Paulo

  • Diretor do Centro de Neuro Oncologia – SP

  • Presidente do Conselho Editorial Brazilian Neurosurgery

  • Presidente do Conselho Deliberativo da SBN

  • Past Presidente FLANC

  • Past Presidente SBN

  • Presidente do Conselho Deliberativo da AACC

  • Membro do Conselho Deliberativo da Academia Brasileira de Neurocirurgia

  • Presidente Emérito do Capitulo de Neuro-Oncologia da FLANC

  • FIRST WINNER RAYMOND SAWAYA AWARD

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